A Reforma da Lei de Falências e Recuperações e os Métodos Alternativos de Resolução de Disputas

Publicada em 24 de dezembro de 2020, a Lei nº 14.112 altera, dentre outras, a Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (“Lei de Falências e Recuperações”), com a finalidade de atualizar a legislação referente à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária.

Relativamente à arbitragem, foram dois os principais dispositivos incluídos.

O novo parágrafo 9º do artigo 6º da Lei de Falências e Recuperações determina que “o processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de arbitragem, não impedindo ou suspendendo a instauração de procedimento arbitral.”

Reitera-se, assim, o entendimento de que a recuperação judicial e a falência não obstam a eventual instauração de procedimento arbitral ou a continuidade de procedimento já em curso. Tal posicionamento já havia sido adotado por parte da jurisprudência, que entende ser eficaz a convenção de arbitragem, independentemente do processamento da recuperação judicial ou decretação da falência, que não são considerados causas para afastar a aplicação da convenção de arbitragem ou suspender arbitragem já iniciada (ver, ilustrativamente, STJ, REsp 1.355.831 – SP, 3ª Turma, Relatora Minª. Nancy Andrighi, j. 19.03.2013).

Ainda, cumpre ressaltar que a Lei nº 14.112/2020 também incluiu na Lei de Falências e Recuperações o parágrafo 2º do artigo 167-M, que dispõe, relativamente ao reconhecimento de processos estrangeiros, que “os credores conservam o direito de ajuizar quaisquer processos judiciais e arbitrais, e de neles prosseguir, que visem à condenação do devedor ou ao reconhecimento ou à liquidação de seus créditos, e, em qualquer caso, as medidas executórias deverão permanecer suspensas.”

Logo, fica clara a possibilidade de processos estrangeiros de insolvência gerarem efeitos no Brasil, de modo que, apesar do reconhecimento de referidos processos, os credores podem ajuizar arbitragens ou dar sequência a arbitragens já em curso, visando à condenação do devedor, ao reconhecimento de seus créditos ou à liquidação de ditos créditos.

Esse dispositivo, assim como o parágrafo 9º do artigo 6º da Lei de Falências e Recuperações, citado acima, evidencia, expressamente, a intenção do legislador de preservar a eficácia da convenção de arbitragem e garantir a continuidade dos procedimentos arbitrais já iniciados, o que confere maior segurança jurídica ao instituto da arbitragem no Brasil.

Assim, é claro que a reforma da Lei de Falências e Recuperações considera e estimula a utilização da arbitragem como método alternativo de resolução de disputas. Mas não apenas da arbitragem. A redação da Lei regulamenta uma nova seção inteira destinada à conciliação e à mediação nos processos de recuperação judicial.

Nos termos do artigo 20-A, a conciliação e a mediação deverão ser incentivadas em qualquer grau de jurisdição e, em regra, não implicarão a suspensão dos prazos previstos na Lei. Segundo o artigo 20-B, “serão admitidas conciliações e mediações antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial.”

Ademais, de acordo com a alínea “j” do artigo 22 da Lei de Falências e Recuperações, ao administrador judicial compete estimular, sempre que possível, a conciliação, a mediação e outros métodos alternativos de solução de conflitos relacionados à recuperação judicial e à falência, respeitados os direitos de terceiros. É evidente, assim, o objetivo do legislador de desafogar o Poder Judiciário, incentivando a resolução de conflitos por outros meios.

Conforme ao parágrafo 1º do artigo 20-B, na hipótese de negociação de dívidas e respectivas formas de pagamento entre a empresa em dificuldade e seus credores, em caráter antecedente ao ajuizamento de pedido de recuperação judicial, será facultado à empresa obter tutela de urgência, a fim de que sejam suspensas as execuções contra ela pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, para tentativa de composição com seus credores, em procedimento de mediação ou conciliação.

É importante também ressaltar que, segundo o parágrafo único do artigo 20-C, requerida a recuperação judicial ou extrajudicial em até 360 (trezentos e sessenta) dias contados do acordo firmado durante o período de conciliação ou de mediação pré-processual, o credor terá reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito dos procedimentos previstos na Lei. Essa regra, evidentemente, gera grande estímulo à celebração e à observância dos acordos pré-processuais.

Da mesma forma que o legislador busca expressamente preservar a eficácia da convenção de arbitragem no processamento da recuperação judicial ou na decretação da falência, verifica-se no texto da Lei a firme intenção de que a conciliação e a mediação também componham a realidade das recuperações judiciais, oferecendo às partes uma alternativa mais célere e independente do Poder Judiciário.